sábado, 22 de janeiro de 2011

Evacuar

“Evacuar” é um verbo que tem vários usos, e todos estão ligados à ideia de “sair”. Contudo, é necessário tomar cuidado ao construir frases com ele. “Evacuar um shopping”, por exemplo, é desocupá-lo, deixando-o vazio, fazer que todas as pessoas saiam dele. Podemos, então, construir a seguinte frase: “Ao ouvirem o alarme, evacuaram o shopping”.

Em outra construção, podemos dizer: “Os policiais evacuaram as pessoas”. Dá para perceber que o sentido é parecido, mas, agora, é específico de “remover”.

No sentido figurado, pode aparecer como se fosse “despejar”: “O próprio anfitrião evacuou os penetras (da festa)” (v. “Aulete”).

Como verbo intransitivo (sem complemento), porém, “evacuar” tem sentido bastante restrito. Significa “expelir fezes”, “defecar”. Analisemos, agora, o seguinte trecho:

“No Brasil, muita gente mora em áreas de risco e o governo não tem programas para atender as vítimas, nem para fazer avisos via rádio nem para ajudar a população a evacuar, se necessário.”

Para evitar o sentido indesejado, bastaria dar ao verbo um complemento. Veja, abaixo, uma sugestão:

“No Brasil, muita gente mora em áreas de risco e o governo não tem programas para atender as vítimas, nem para fazer avisos via rádio nem para ajudar a população a evacuar áreas perigosas, se necessário.”

Usar mal ou fazer mau uso?

Imaginemos um estudante que começa sua redação com a seguinte frase:

"O principal problema das grandes cidades brasileiras é o caos na urbanização e o mal uso dos recursos públicos".

Aparentemente está tudo bem com a oração. Entretanto, é mais comum o equívoco numa expressão como “mau uso” do que numa expressão como “mau aluno”. O problema está no fato de “uso” ser um substantivo abstrato (vem do verbo “usar”) e “aluno” ser um substantivo concreto.

A explicação aparece quando empregamos o verbo ou o substantivo. Se empregarmos o verbo: “Ela usa mal”, (temos o advérbio, contrário de “bem”), mas, ao empregarmos o substantivo: “Ela fez mau uso”, (temos o adjetivo: contrário de “bom”). A confusão entre usar mal e fazer mau uso deve ser o responsável por esse erro, ainda tão frequente. Continua valendo a antiga lição: mau/bom, mal/bem.

E não devemos esquecer que “mal” também pode ser substantivo, como no exemplo: “a luta do bem contra o mal” e até conjunção subordinativa temporal, em: “mal entrou na sala, viu aquilo”, indicando momento exato.

Vejamos agora a correção do texto:

"O principal problema das grandes cidades brasileiras é o caos na urbanização e o mau uso dos recursos públicos".

os pronomes oblíquos da terceira pessoa do discurso

É fundamental conhecer a transitividade verbal para usar corretamente os pronomes oblíquos da terceira pessoa do discurso, ou seja, é preciso saber se o verbo a ser utilizado na oração é transitivo direto ou indireto. A importância está no fato de o objeto direto poder ser substituído pelas formas o, a, os, as e o objeto indireto pelas formas lhe e lhes.

Entretanto existem verbos que requerem os dois complementos ao mesmo tempo. Veja: “Entregou o presente ao filho”. Quando substituímos o primeiro objeto (“o presente”), que não é preposicionado, usamos “o” (“Entregou-o ao filho”); ao substituirmos o segundo (“ao filho”), que é encabeçado pela preposição “a, usamos o “lhe” (“Entregou-lhe o presente”). Hoje está em desuso a substituição simultânea dos dois objetos, que, nesse caso, resultaria na seguinte construção: “Entregou-lho”.

Nesse caso, é mais fácil os usuários da língua se saírem bem, pois a maioria associa a forma “lhe” a pessoas e as formas “o” e “a” a coisas. É importante lembrar que isso é válido para a maioria dos casos, mas não constitui regra. Há inúmeros verbos transitivos diretos que admitem o complemento de pessoa. Observe: “avisou-o”, “estimulou-o”, “ajudou-o”, “incentivou-o”, “favoreceu-o”, “convenceu-o”, “impediu-o”, “respeitou-o”, “rejeitou-o”, “levou-o” etc.

Analisemos a escolha feita pelo redator no trecho abaixo:

“O acusado afirma que não o bateu com arma de fogo, mas que lhe deu dois tapas.”

Perceba que o verbo “dar” (dar algo a alguém, “dar-lhe dois tapas”) foi empregado corretamente, mas a confusão apareceu na construção do verbo “bater”, aqui tratado como transitivo direto.

O problema é que “bater” pode ser transitivo direto, mas com outro sentido. Por exemplo: “Bateu um prego com muita força” (ou “Bateu-o com muita força”), “Bateu o carro no teste drive” (ou “Bateu-o no teste drive”) etc.

No caso em questão, trata-se de “bater em alguém” (“bater-lhe ou “bater nele”), um sinônimo de “agredir”, este, aliás, transitivo direto (“agrediu-o”). Para corrigir esse fragmento seria possível empregar uma das construções abaixo:

O acusado afirma que não lhe bateu com arma de fogo, mas que lhe deu dois tapas.

O acusado afirma que não bateu nele com arma de fogo, mas que lhe deu dois tapas.

A associação; a crase e horários

Sempre que pretendemos redigir um texto nos deparamos com o “fantasma” da ortografia. É muito comum cometer falhas quando aplicamos o princípio da associação.

Seguindo esse princípio é fácil pensar da seguinte forma: se “puxar” se escreve com “x”, “puxador” só pode ser com “x” também, e não com “ch”. Certo? Sim, na maioria dos casos a associação é válida. Mas, nem sempre podemos confiar nela. Observe a oração abaixo:

“As provas têm início às 8h da manhã; e se extendem até às 20h.”

Ao escrever a palavra “extendem”, o redator fez a associação com “extensão” (com “x” mesmo). O problema está no fato de, tanto o verbo como o substantivo virem do latim, onde são grafadas com “x” (extendere e extensione, respectivamente). Com o passar dos anos o sistema ortográfico da língua portuguesa evoluiu e o verbo ficou com “s” e o substantivo passou a ser grafado com “x”.

Podemos observar mais dois problemas na redação da oração. O primeiro, a redundância, está caracterizada no uso da locução “da manhã”. Na linguagem falada é comum e até admissível em alguns casos, contudo, nesse caso, sua utilização é desnecessária, já que o redator está usando a escala de 24 horas.

O segundo diz respeito à crase. A gramática ensina que, antes da indicação de horas, sempre ocorre crase. Isso se aplica quando nos referimos às locuções adverbiais de tempo cujo núcleo é a palavra “hora” (ou seu plural, “horas”). Podemos reconhecer essas locuções respondendo à pergunta “Quando?”. Observe: “Quando você chegará? No domingo, às 18 horas”, “Quando ocorreu o acidente? Ontem, às 12 horas (ou ao meio-dia)”.

Entretanto, há situações em que a indicação de horas é precedida de uma preposição diferente do “a”. Quando isso ocorre, deixa de haver a fusão de dois “aa” a que chamamos crase. Assim: “A reunião estava marcada para as 17h”, “Estarão lá entre as 15h e as 18h”, “As provas se estendem até as 23h”.

Veja, agora, a frase corrigida:

As provas têm início às 8h e se estendem até as 23h.